Primeira fase da Série C deixa um alerta ao “país do futebol”
Após 18 rodadas, a primeira fase da Série C do Brasileirão se encerra neste sábado. Duas vagas para a segunda fase e outras duas na zona de rebaixamento seguem em aberto. Com grandes definições deixadas para essa última rodada, o sábado promete ser histórico para muitas equipes da terceira divisão.
Para além da definição das quatro vagas em aberto, a última rodada também vai oferecer os primeiros resultados do novo formato de disputa da competição. Pela primeira vez, a Série C abandonou os grupos regionalizados e abraçou o turno único com seus vinte integrantes.
Para promover a mudança, os vinte participantes se reuniram, ainda em fevereiro, e votaram a pauta. Por 12 a oito, a alteração foi aprovada, mas a distribuição de votos diz muito sobre os riscos dessa decisão. Todos os oito votos contrários vieram de clubes do nordeste – incluindo o Vitória.
Anteriormente, a Série C era dividida em dois grupos regionalizados. O Grupo A normalmente era formado por equipes do norte, nordeste e centro-oeste, com o Grupo B sendo composto por clubes do sul e do sudeste. Dessa forma, os clubes de “fora do eixo” tinham garantidas quatro vagas à segunda fase e apenas duas na zona de rebaixamento.
Com a dissolução dos grupos, essas garantias acabaram. Por um lado, dizem que a mudança premia os melhores clubes, garantindo que os promovidos serão, de fato, os quatro melhores da divisão, e que os menos preparados serão rebaixados. É um raciocínio compreensível, mas essa nova dinâmica vai muito além da questão esportiva. A médio-longo prazo, esse novo formato pode ser danoso à cultura do futebol no Brasil.
A tabela de classificação da Série C, nesta sexta (12), mostra o G8 composto por quatro equipes do norte-nordeste, embora apenas duas delas já estejam com a vaga assegurada. Um cenário semelhante ao previsto pelas garantias dos grupos regionalizados. Mas o verdadeiro problema está na parte debaixo da tabela. Nas últimas oito posições, estão sete equipes de “fora do eixo”. O único intruso é o Brasil de Pelotas, que está na zona de rebaixamento, mas ainda pode se livrar da queda. Três nordestinos o acompanham no Z4, dois deles já despromovidos. E um terceiro nordestino ainda será rebaixado neste sábado.
Se a zona de rebaixamento da Série C se tornar terreno fértil para o futebol do norte, nordeste e centro-oeste, poderemos ter, em breve, uma terceira divisão centralizada no eixo sul-sudeste – a depender, é claro, dos promovidos da Série D.
Isso seria bastante prejudicial por desmobilizar os fãs do esporte de cidades com poucos representantes nas principais divisões nacionais, como Aracaju, por exemplo, caso o Confiança seja rebaixado neste sábado. Com a menor representatividade das regiões norte, nordeste e centro-oeste, a possibilidade de acesso desses clubes à Série B também seria reduzida, podendo gerar um efeito dominó.
Vale ressaltar, é claro, que nada disso aconteceria num piscar de olhos. Esse fenômeno só deve ser percebido após uma ou duas décadas de manutenção do formato, nesse cenário pessimista.
O país do futebol – como o Brasil tanto se orgulha de ser – precisa estar sempre ciente de que suas fronteiras ultrapassam os limites do sul e do sudeste. Caso contrário, a “maior torcida do país”, que é a das pessoas que não tem um time do coração, só tende a crescer.
- William Tales Silva, Jornalista. Repórter de esportes da TV Band Bahia. Autor do livro “[VAR] – A história e os impactos da maior mudança na aplicação das regras do futebol”, o primeiro sobre o árbitro de vídeo no Brasil, pela editora Footbooks/Corner. Já foi apresentador do Jogo Aberto da BandNews FM Salvador e teve oportunidades como apresentador do Jogo Aberto Bahia e comentarista da Série C do Brasileirão na TV Band Bahia.
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